Da cólera ao mais profundo silêncio


Talvez ele nunca saiba o efeito cataclísmico que suas idas e vindas me causou. Talvez ele nunca reconheça que a efemeridade de seus sentimentos me transformou... pra sempre. Embora doída, eu sou grata. Imensamente grata, por tudo que aquela história me trouxe. Por toda dor, por toda decepção, por toda angústia, comigo e com o outro, que me fez crescer tanto.

Quase um ano desde a última vez que escrevi. Fui do mais profundo silêncio à verborragia mais intensa. Feri muita gente no percurso. Fui ferida também. E embora precoce, os fios brancos tem florescido com mais frequência no negro dos meus cabelos. E eu tenho me apaixonado cada vez mais por eles. Uma espécie de orgulho. Como aquele que eu sinto por cada cicatriz que enfeita o meu corpo alma e coração. O tempo nos ensina a separar o joio do trigo, mas é que às vezes é tão mais bonito ignorar. A vida reúne o tempo todo, as provas necessárias para que sigamos em frente e deixemos senão tudo, parte, de tudo aquilo que nos atrasa e entristece, para trás. Mas é que às vezes é tão mais bonito ignorar. E se a gente deposita pela quinquagésima vez, toda a nossa fé, e, entrega tudo que a gente possui de mais genuíno, em algo infrutífero e estéril, não é nossa, a responsabilidade do fracasso? Não é nossa toda culpa pela desilusão?

A insistência muitas vezes é um erro. A insistência faz com que a gente enxergue, muitas vezes, apenas a parte da história que a gente deseja enxergar. Às vezes a gente decide acreditar mais uma vez, pura e simplesmente, porque não se sente pronto pra abandonar. Se desprender. Deixar partir. Palavras são apenas palavras. As pessoas tantas vezes nos dão sinais do que querem e do que não querem, com ações.

Ontem eu quis fugir. Vesti um moletom, olhei o céu e ele ameaçava chuva. Dei de ombros. Embora a minha racionalidade disfarçada de intuição, gritasse que iria chover, eu ignorei. Paguei pra ver e perdi. A chuva que antes era apenas um palpite de um velho céu, caiu sobre meus ombros, como a cinta do pai que castiga a rebeldia de seu filho. Então eu apanhei. E chorei em silêncio por todos os anos que eu optei por desprezar os desígnios de Deus. Por todas as bênçãos que eu recusei em troca de ilusões. Por tudo que eu podia ter sido e não fui. Eu chorei. E embora aquele choro não tivesse fim, a chuva cessou. E com ela, foi embora a dor, a amargura e o desengano. Eu sempre achei que era a cólera que me dava forças e me tornava inatingível. Eu estava errada. A cólera, na maioria das vezes, nos torna doentes e vai correndo aos pouquinhos, nossa energia, nossa fé e a nossa esperança de outro amanhecer.

Hoje, mais serena e consciente de tudo quanto eu me permiti atravessar ao longo desses anos, eu escolho, não. Eu escolho não ficar com raiva ou vociferar contra o universo ou contra todos os ventos contrários que desviaram minhas estradas, das dele. Eu escolho não odiar o outro, pela falta de caráter, pelo egoísmo, pela volubilidade ou pela falta de tato. Eu escolho não desejar o mal ou praguejar contra a sorte, de quem me causou o mais profundo sofrimento. Eu escolho ser a “idiota” às vezes. Porque isso poderá significar que a minha esperança na melhora e na mudança do ser humano, ainda é viva em mim (ou pode ser só babaquice de gente Bethânia e louca.). Eu escolho deixar os outros serem responsáveis por suas escolhas. Eu escolho não responder.

Eu poderia me depreciar, poderia amaldiçoar o universo e fazer birra feito criança que não ganha o brinquedo. Mas é que cedo ou tarde, a maturidade chega e impede que a gente saia por aí vociferando frustrações. Eu sei que vez em quando é doído fazer a escolha certa. Percorrer o caminho certo. E é bem difícil compreender os desígnios de Deus e esperar o Seu tempo. Para florescer é preciso bem mais que água. É preciso, tempo. E eu sei o quanto pode parecer difícil superar algo que insiste em te pôr pra baixo. E é. Mas acho que não há muito sentido em viver a vida, se não for pra nos tornarmos no melhor que podemos ser. Então a minha prece de hoje é que a gente consiga enxergar na gente, a força necessária para persistir e recomeçar sempre que a vida exigir um pouco mais.

Que Deus ilumine todos aqueles que me sacanearam, mentiram, machucaram, traíram, ludibriaram, ofenderam. Que Deus os ajude a compreenderem suas razões e que os cubra com bênçãos. E se possível, que os mantenha distantes de mim. Que Deus também abençoe aqueles a quem eu magoei. Que Deus me ajude a compreender as minhas razões e transformá-las em atitudes de amor e bondade. Que Deus me ajude a ser uma pessoa melhor. Que a vida continue me ensinando a ter calma e o tempo me torne mais paciente. E que a gente não desista nunca de ser feliz. Porque vida é só essa. E é pra se ter alegria.

"Às vezes a gente escolhe é a atitude errada. E acha que tudo depende é da nossa vontade de fazer dar certo, de brigar pra dar certo... Mas às vezes ficar insistindo e batendo naquela mesma velha tecla só faz é roubar tempo e energia da gente. Só faz é impedir que a gente veja e trabalhe pelo surgimento de um novo caminho, de novas escolhas... Quem busca prata onde só há lataria, nunca conseguirá encontrar outra coisa além de frustração."

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